24 de abr. de 2013

COLUNA DO MACIEL: O patrulhamento ideológico como rótulo


Liberdade é uma possibilidade de ser melhor, enquanto que a  escravidão é uma certeza de ser pior”. Alber Camus
Um ateu pode evocar a liberdade religiosa, além da própria liberdade de não professar qualquer fé sobrenatural. Não é preciso ser do sexo feminino ou de qualquer orientação sexual para evocar a liberdade dos papéis sexuais. Ninguém precisa ser filiado a um partido para expressar livremente o seu próprio pensamento político e defender o direito de todos fazerem o mesmo. Não importa ter opinião individual afim de se aliar as demais opiniões para que elas todas possam absolutamente fluírem sem qualquer cerceamento.
E, mais especificamente, não é necessário ser comunista para apregoar o direito dos comunistas de fazerem parte da democracia, assim como os conservadores, de direita e de qualquer outra ordem, ideológica ou não.
O tema prossegue à tona do domingo passado para hoje. Na coluna anterior, A cassação de um caçado, foi escrito sobre a maneira açodada e arbitrária como se deu a cassação do mandato do então suplente de vereador Moacyr Reis Ferraz, que jamais negou ser comunista e não se candidatou pelo PCB devido todos os partidos comunistas estarem na clandestinidade. Tudo também fizeram para prejudicá-lo ao investigarem a vida profissional constataram ser ele uma pessoa correta, zelosa e cumpridora dos seus deveres.  Se ele pertencesse a um outro espectro ideológico, também mereceria defesa, em nome da democracia, que pressupõe inarredavelmente a liberdade de expressão e de organização, também político-partidária.
Sem me importar se poderia ser confundido como comunista por defender a liberdade de um comunista, a questão colocada foi a forma injusta da cassação unânime promovida pela Câmara de  Vereadores, ao afrontar – não o Moacyr – mas a soberana decisão do povo através da votação conferida a ele.
Agora, no último dia 16, o Senado aprovou a devolução simbólica do mandato de senador e líder comunista Luis Carlos Prestes, cassado sem o direito de defesa, e à época eleito com a maior votação proporcional dada a um político em todo o Brasil. A reparação é legítima, sendo ele comunista ou fosse anarquista, socialista, capitalista, não importa, o fundamental era – como deve ser atualmente – respeitar a soberana manifestação do povo, legitimamente expressa nas urnas, algo que não poderia ser jamais violado.
Assim sendo, a devolução simbólica do mandato de Moacyr pela Câmara de Vereadores mourãoense há de se tornar, sem dúvida, a reparação do dano, histórica e atualmente, respeitando o povo que votou para os demais vereadores e também sufragou o nome dele. Claro, será preciso que um dos vereadores tome a iniciativa e obtenha o apoio dos demais e viabilizem tal iniciativa. Caso ocorra, a Câmara também irá restabelecer o sentido democrático do parlamento local, sem aquela mancha totalitária e covarde.     
Além de outros motivos e fatos, o Brasil infelizmente também se caracteriza por rotular as pessoas, e o que é pior, sem conhecê-las minimamente, fazendo juízo de valor que se mostra discriminatório, preconceituoso e portanto injusto. Os militares, que deram o golpe e impuseram a ditadura dos quartéis, rotulavam a todos que ousavam questionar o governo dos generais, os opositores eram logo tratados como “subversivos”, “comunistas” ou de “esquerda”. O patrulhamento ideológico faz parte de uma prática política ruim, e os rótulos são pregados sem o conhecimento de causa ou simplesmente  postos como se fossem verdades inquestionáveis, tanto é assim que o pretexto para o golpe foi a chamada “ameaça comunista” que jamais existiu a ponto de considerar razoável que os partidos comunistas tivessem forças sócio-políticas suficientes para chegar ao poder.
Fases de Fazer Frases (I)
Se a mentira tem pernas curtas, a verdade tem olhos grandes?
Fases de Fazer Frases (II)
Se em terra de cego quem tem olho é rei, ninguém enxerga quem tem o rei na barriga.
Olhos, Vistos do Cotidiano
Conforme o noticiado pelos meios de comunicação, além do Artigo anterior sobre o mesmo tema (A cassação de um caçado), o encontro do dia dez passado sobre a ação da ditadura militar em nossa região repercutiu no endereço eletrônico da Fecilcam que informou sobre o fato. Noutro sítio, da Associação de Anistiados Políticos, a notícia foi bem destacada.  
Reminiscências em Preto e Branco (I)
Como o tema principal hoje tem a ver com o comunistas, lembro de um servidor público estadual que conheci chamado Rui, militante do PCB em Curitiba (infelizmente não lembro-me do sobrenome dele). Ao ser perguntado certa vez (quem indagou o fez com seriedade) se de fato “comunista comia criancinha”, o Rui, após tragar e expelir a fumaça do cigarro, foi ironicamente enfático: “Nós comunistas não comemos criancinhas! Agora, a partir dos 15, 16 anos tragam elas pra mim que eu como”.    
Reminiscências em Preto e Branco (II)
Grande parte das pessoas está condicionada a acordar apenas por causa do despertador. Antigamente na roça, as pessoas mentalizavam a hora que desejavam despertar e jamais dormiam a mais. Em meus tempos de menino, quando tinha que acordar mais cedo do que o habitual, pedia ao meu pai e ele, sempre preciso, criado no campo, era quem me acordava, apertando levemente o dedão do meu pé, “filho, está na hora de acordar”.
Reminiscências em Preto e Branco (III)
E por falar em acordar devemos não cochilar em relação ao correto uso da nossa língua. É errado dizer “eu me acordei”. Ninguém acorda a si próprio. O certo é apenas dizer eu acordei. Quando alguém ou algo nos desperta, aí sim pode se dizer, “eu me acordei com o barulho da rua”.
José Eugênio Maciel escreve coluna aos domingos no jornal Tribuna do Interior. É professor, sociólogo, advogado e membro da Academia Mourãoense de Letras.

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